BALAÃO
No hebraico, o termo tem sentido desconhecido, embora talvez signifique devorador, ainda que alguns digam que significa estrangeiro. Balaão foi um adivinho pagão que vivia em Petor, cidade da Mesopotâmia (ver, Deu. 23:4), pertencente aos midianitas (ver Núm. 31:8).
1. Pano de fundo. Ele tinha algum conhecimento de Deus, julgando que os próprios poderes dos adivinhos, profetas e poetas derivam-se de Deus. Temia o avanço dos israelitas. Julgava que ninguém lhes poderia oferecer resistência. Eles já haviam conquistado Jericó e certas regiões dos moabitas, e os midianitas poderiam ser as próximas vitimas. A destruição ameaçava por toda a parte.
2. Confrontos. Balaque, rei de Moabe (1401 A.C.), firmou uma liga com os midianitas e enviou mensageiros a Balaão, para que ele viesse ajudá-lo com suas adivinhações (ver Núm. 22:5 ss). Balaão não se sentiu tranqüilo diante do convite, e recebeu expressa proibição da parte de Deus, ao iniciar viagem (ver Núm. 22:9 ss). Portanto, sentiu que não podia amaldiçoar a Israel, e despachou os mensageiros de volta a Balaque. Porém, este enviou a Balaão uma embaixada de mensageiros ainda mais honrosos com promessas de recompensá- lo e honrá-lo. Balaão retrucou que não se deixaria tentar, mas que diria somente aquilo que Deus lhe permitisse dizer. E acompanhou os mensageiros, sob a condição de que só diria aquilo que Deus lhe permitisse dizer.
A ira de Deus manifestou-se contrária a Balaão, no episódio de sua jumenta, que agiu de maneira estranha, ao sentir a presença do anjo. E a jumenta, fustigada por Balaão, falou através do poder do anjo. Ela lembrou Balaão de todo o bom serviço que lhe havia prestado e de como ela não merecia tão brutal tratamento. Foi então que Balaão divisou o anjo, armado de espada. Ao dizer que poderia voltar, recebeu ordens para seguir caminho, e assim o fez. Ao encontrar-se com Balaque, reafirmou que só diria o que lhe fosse permitido da parte do Senhor. De acordo com suas instruções, foram preparados sete altares. Por três vezes Balaão tentou falar contra o povo de Israel mas foi controlado a proferir bênçãos, e não maldições. (Ver Núm. 24:17). Por esse motivo, ao invés de proferir maldições, Balaão instruiu Balaque para que pusesse tropeços no caminho do povo de Deus, por meio da corrupção e da fornicação (ver Núm. 31:16). Balaão nada ganhou com sua impiedade. Houve uma batalha entre Israel e os midianitas, e Balaão foi morto durante a refrega. Todavia, Israel também recebeu o devido castigo, por ter-se deixado corromper (ver Núm. 31:16). O vigésimo quinto capítulo do livro de Números mostra-nos que essa batalha redundou em graves perdas para os midianitas.
3. Uma lição. A narrativa ilustra um importante princípio espiritual, que reza: Benditos os que te abençoarem (ó Israel), e malditos os que te amaldiçoarem (Núm. 24:9).
4. Uso metafórico do episódio. O ensino de Balaão. No Novo Testamento encontram-se várias interpretações dos atos de Balaão, vinculadas a lições espirituais: a. o trecho de II Pedro 2:15 refere- se ao caminho de Balaão. Trata-se da comercialização do dom profético, ou, de maneira mais geral, o dinheiro e outras vantagens materiais exageradas, adquiridos mediante a comercialização da religião, b. Em Apocalipse 2:14 há menção à doutrina de Balaão, que é a corrupção de pessoas piedosas, levando-as a abandonarem sua atitude separatista e a se degradarem na imoralidade e no mundanismo. Vê-se, assim, que é possível corromper àqueles que não podem ser amaldiçoados (ver Núm. 31:15,16; 22:5; 23:8). c. Em Judas 11, lemos sobre o erro de Balaão, que consiste na suposição de que Deus deve amaldiçoar o seu povo quando este pratica o que é errado. Deus julga, mas não amaldiçoa aos seus. A missão de Cristo protege as almas dos crentes, mas não é por isso que eles escapam ao castigo, quando merecido (ver Heb. 12:5). d. A mistura do bem com o mal. A vida de Balaão sugere-nos ainda uma outra lição, que não precisa ser salientada por algum termo especial. Em um homem, mesmo que seja profeta, pode haver a mescla do bom com o ruim, com intenções nobres e atos vis, ou a mistura da verdade com idéias do paganismo. Todos nós tornamo- nos culpados desse erro, em maior ou menor grau, pois isso faz parte daquilo que significa alguém ser um pecador. E essa mescla torna-se mais notória ainda quando envolve um presumível líder espiritual. Quanto a notas expositivas mais completas sobre o caminho, a doutrina e o erro de Balaão, ver essas referências e a exposição das mesmas no NTI.
5. Detalhes dos usos metafóricos
Balaão. Sua narrativa pode ser encontrada em Núm. 22-24. Segundo as tradições judaicas, Balaão se tornou símbolo de todos quantos ensinavam ou encorajavam o povo de Israel a envolver-se na idolatria, o que, naturalmente, incluía os vícios pagãos que acompanhavam esse sistema, os quais eram os excessos da gula, do alcoolismo e da prostituição. (Ver Filo, Moses I.53-55; Josefo, Antiq. iv.6.6 e Sanedrim 106a). Balaão não foi um inimigo declarado de Deus. Professava adorar a Deus, mas traiu ao povo antigo de Deus, levando-os a aceitarem idéias e maneiras pagãs, tendo assim tentado destruir o caráter deles como um povo separado.
Os seguidores de Balaão dos tempos cristãos não possuem integridade de alma. Podem ser indivíduos religiosos, mas se caracterizam por defeitos vastos e sérios em sua vida espiritual, e terminam por exercer uma influência negativa sobre a maioria das pessoas, ao invés de contribuírem para a piedade.
Por não poder amaldiçoar ao povo de Israel, Balaão tentou corrompê-lo, e isso levando seus varões a ter relações sexuais com mulheres moabitas, assim manchando a separação deles. Assim sendo, produziu a união entre a igreja e o paganismo, exatamente o que sucedia em Pérgamo. O culto do imperador tentava os crentes a transigirem com a idolatria; mas o gnosticismo parece ter sido a principal força que buscava corromper a moral da igreja cristã, Os crentes de Pérgamo deixaram de ser peregrinos à face da terra. Acomodaram-se ao paganismo, até mesmo dentro dos limites da igreja. A imoralidade em seus líderes (e, por conseguinte, nos seus discípulos) era aceita como «normal» na ética cristã. Portanto, o evangelho perdeu ali o seu imperativo moral.
No tocante a Balaão, nas páginas do N.T., examinar as notas expositivas no NTI sobre: 1. o caminho de Balaão, II Ped. 2:15. 2. Sobre o erro de Balaão, Jud. 11.2,3. 3. A doutrina de Balaão, ver Apo. 2:14. A atitude moral de Balaão na vida se tornou a doutrina oficial, a ética cristã, em Pérgamo. A imoralidade tornou-se algo desejável, como se tivesse finalidades boas no seio da igreja cristã. Em outras palavras, a mentalidade pagã, no tocante às questões sexuais e outras, tornou-se a mentalidade prática e a doutrina da igreja dali. Os gnósticos julgavam ser aconselhável contaminar o corpo, a fim de degradá-lo, o que ajudaria no sistema mundial, em sua tentativa de destruir a matéria. Tolamente imaginavam que anjos se punham a seu lado, sussurrando em seus ouvidos, procurando conduzi-los a todas as formas de deboche.
A armar ciladas diante dos filhos de Israel, Apo. 2:14. Balaão, literalmente procurou levar os israelitas a adotarem idéias pagãs, a tomarem esposas pagãs, a se envolverem na idolatria e seus vícios. Espiritualmente falando, eles estavam caindo. O termo grego aqui usado é skandalon, armadilha, ou qualquer coisa que leva alguém a tropeçar ou cair. O ardil de Satanás consistiu do atrativo de mulheres pagãs, dos deleites pervertidos da adoração pagã. Satanás tem suas tentações, que agem como armadilhas. Transformam-se então em vícios, que são extremamente difíceis de extirpar.
A mulher licenciosa tem manoplas de ferro. Suas vítimas não conseguem escapar com facilidade. O homem licencioso tem um vício de aço, que oprime o seu cérebro. Não pode ser libertado facilmente, a despeito de todas as boas influências. Esses são ardis das influências satânicas. Essas coisas podem cativar até mesmo aos líderes da igreja, tal como sucedeu em Pérgamo e continua a acontecer até hoje. O poder do evangelho, dessa maneira, é anulado.
...para comerem coisas sacrificadas aos ídolos, Apo. 2:14. Esse era um dos maiores problemas da igreja neotestamentária. Quanto a um exame completo sobre a questão, ver as notas expositivas no NTI sobre o oitavo capítulo da primeira epístola aos Coríntios. O comer de coisas sacrificadas aos ídolos é algo que pode ocorrer em mais de uma maneira. As carnes assim oferecidas podem ser vendidas nos mercados após terem servido a seus propósitos, nos templos pagãos. 0 crente pode adquirir dessa carne, sem sabê-lo, ou mesmo sabendo do fato. Para Paulo, essa possibilidade era uma questão indiferente, enquanto algum irmão mais escrupuloso não fizesse objeção, ofendendo-se porque alguém «comia» dessa carne. Todavia, outros crentes entravam em templos pagãos, convidados por seus vizinhos para alguma festividade, em honra ao deus oi deuses, patronos do templo em questão. Esses raciocinariam como segue: Um ídolo nada é, pelo que tudo isso não passa de uma fraude; e a carne aqui oferecida à venda é tão boa como qualquer outra. Se um crente assim agisse, sua ação se tornava muito mais questionável. Além disso, Paulo relembrou aos crentes que a adoração pagã na realidade, tem demônios por detrás da mesma. De fato, o ídolo nada é, mas é possível que, através do ídolo, algum poder espiritual negativo real esteja sendo adorado, como um demônio. (Ver I Cor. 10:20 quanto a essa crença).
Era comum a idolatria ser vista no judaísmo como símbolo externo e físico da adoração aos demônios, em que estes recebiam homenagem dos homens. Se esse é o caso, então nenhum crente tem o direito de entrar em um templo pagão, pois, na realidade, o ídolo nada é, mas é um meio de entrar em contacto com os poderes malignos. Portanto, honrar a um ídolo, em qualquer sentido, também é honrar ao poder espiritual por detrás do ídolo. Ver a progressão da censura neotestamentária ao comer carnes oferecidas a ídolos.
No oitavo capítulo da primeira epístola aos Coríntios, a questão é indiferente. Mas I Cor. 10:25 nos fornece boa razão para condenarmos alguns aspectos dessa prática. O trecho de Rom. 14:19,22-25 é mais estrito, e Atos 15:20 é uma proibição total, o que se reitera em Apo. 2:14. A princípio, Paulo mostrou-se tão liberal quanto era possível ser. Mas a experiência mostrou não ser viável, nesse caso, a liberalidade. Portanto, gradualmente Paulo foi fortalecendo suas proibições e censuras. Finalmente, a igreja proibiu toda essa prática, provavelmente em todos os seus aspectos. Aquele que entrasse em um templo pagão, a fim de participar de uma festividade, também seria tentado a praticar algo da «prostituição sagrada, dando dinheiro às mulheres que, supostamente, serviam à divindade honrada, dinheiro esse que, subsequentemente, entrava para os cofres do templo pagão. Somos informados que em Corinto, na época do apóstolo dos gentios, havia nada menos de mil prostitutas sagradas, envolvidas nesse nojento negócio.
...e praticarem a prostituição, Apo. 2:14. Tradicionalmente, a idolatria sempre esteve vinculada à prostituição. Havia prostitutas sagradas, conforme foi descrito acima. Alguns deuses e deusas eram adorados, desavergonhadamente, em meio a orgias sexuais desenfreadas. Em I Cor. 6:9, podemos notar a lista dos vícios, em que se lê sobre os fornicários e idólatras, nessa ordem. Várias listas de vícios do N.T. apresentam esses dois pecados, embora não necessariamente juntos. (Ver Apo. 22:15).
A festividade deleitosa —Várias referências, nos escritos clássicos, mostram que as festas idólatras, nos templos pagãos, faziam parte importante da vida social dos antigos gregos e romanos. Tucídides mostra que tais festas (que envolviam sacrifícios), faziam parte dos entretenimentos populares. Suetônio (Cláudio, 33) relata como Cláudio, o imperador romano, estando certo dia no fórum, ao sentir o aroma delicioso de uma festa, que estava em preparativos no templo de Marte, deixou o tribunal e tomou lugar à mesa, ao lado dos sacerdotes, a fim de regalar-se. É claro que os crentes, muitos dos quais tinham sido criados entre tais eventos sociais, que envolviam festividades e sacrifícios, com facilidade continuariam tais práticas, embora não mais sentissem que estivessem homenageando a qualquer deidade pagã. Isso fazia parte da estrutura social da época, bem como da vida social. Aqueles que punham ponto final a todas as suas relações com os templos, não se separavam apenas religiosamente, mas até mesmo socialmente.
Em tempos de perseguição, a questão ainda se tornava mais aguda. Provar os vinhos das libações oferecidas aos deuses pagãos, ou comer das carnes a eles oferecidas, eram considerados atos de homenagem a tais divindades, em cujos templos essas festividades tinham lugar. Ao mesmo tempo, tal ação indicaria que o indivíduo renunciava ao cristianismo.
Fonte:Russell Norman Champlin
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