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Devem as igrejas pagar impostos ao Estado?

Comentei em meu perfil no Facebook sobre a minha posição favorável a que as igrejas paguem impostos, na forma da lei, por entender que isso ajudaria a tornar mais transparentes as suas contas e por compreender que a elas não cabem quaisquer benesses concedidas pelo Estado. É óbvio que o tema é polêmico. Há quem concorde. Há quem discorde. Bem, aqui vão as principais razões, por partes, pelas quais entendo que esse privilégio deveria ser revisto.

1) Impostos existem desde tempos imemoriais e, sejamos sinceros, nenhum de nós gosta de pagá-los. É algo que fazemos com certa contrariedade, principalmente quando se trata de cobranças escorchantes. Mas são eles que dão ao Estado condições de assistir aos contribuintes naquilo que lhe compete. Ou seja, a discussão não busca avaliar se são ou não mal aplicados, mas parte do princípio que eles são indispensáveis para o funcionamento da máquina pública. Se isto não vem sendo feito a contento é outra história. Cabe a nós, eleitores, melhorarmos a qualidade do nosso voto. Portanto, acho que esse não é um bom argumento para justificar a isenção tributária das igrejas.

2) Mas voltando apenas aos tempos do Novo Testamento, vemos a menção ao tributo, quando os fariseus usam-no como isca para tentar apanhar Jesus numa armadilha. O Mestre soube sair do "laço" de forma sábia, como não poderia deixar de ser, sem deixar de reconhecer que, se a moeda circulante pertencia ao Império Romano, a ele caberia receber os impostos devidos, Mateus 22.17-22. Ele mesmo, certa vez, cumpriu de forma miraculosa essa obrigação: pagou os seus impostos, Mateus 17.24-27. Mais tarde, já no período dos primeiros dias da igreja, Paulo não só reconhece a instituição divina da autoridade, como também se reporta ao dever cívico de pagar tributos em ambiente onde os cristãos eram perseguidos pelo poder dominante, Romanos 13.1-7. Em outras palavras, o pagamento de impostos ao Estado é chancelado pela Escritura.

3) Certamente, dirá alguém: "Naquela época não havia templos cristãos de modo que não houve nenhum ensinamento bíblico a respeito". É verdade. Mas também não convém esquecer que os templos entraram na história do Cristianismo com a constantinização da igreja, nos idos dos anos 300 DC. Antes, os que professavam a Cristo reuniam-se em casas, catacumbas, às escondidas, sem nenhuma benesse do Estado. Não podemos deixar de ressaltar que no ambiente neotestamentário o templo perde a sacralidade que tinha no Antigo Testamento. Tanto Jesus corrobora a tese (João 4.20-24) como Estevão sofre o martírio por tocar em vários pontos nevrálgicos para os judeus, entre eles a sacralidade do templo em Jerusalém, Atos 7.44-50. Pois é aqui que reside o problema.

4) Ora, com o advento do Cristianismo como religião oficial do Império Romano, a partir da conquista do trono imperial por Constantino, a igreja passa a desfrutar de privilégios, como a isenção de impostos, o pagamento de seus clérigos pelo Estado, a ascensão de muitos cristãos a cargos de destaque na estrutura de governo, além da incorporação dos templos para os cultos, alguns deles "sequestrados" dos cultos pagãos por ordem do Estado, algo que não ocorria até então. A história é pródiga em mostrar que essa aliança só foi ruim para a igreja. Não preciso descer aos pormenores. Vale dizer apenas que todas essas "vantagens" tiveram cunho político, como algumas, hoje, só têm cunho eleitoreiro.

5) Infelizmente, continuamos com o mesmo modelo. Gostamos de construir templos imponentes, suntuosas catedrais, onde gastam-se rios de dinheiro, com a mesma aura de sacralidade repudiada no Novo Testamento. Na continuidade, pelas vias da informalidade, vê-se cada vez mais essa aliança entre a igreja e o Estado praticada em todos os níveis de governo sempre em busca de privilégios sob os mais diferentes argumentos, como, por exemplo: "O que estamos fazendo é pela causa", quando, aqui entre nós, a causa passa longe desses acordos, onde prevalecem vantagens com fins nada recomendáveis.

6) Diante do exposto, conforme a máxima de Jesus: "Dai pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus", é preciso rever a nossa caminhada. levando em conta o lema da Reforma: "Uma igreja reformada sempre se reformando". A igreja deve caminhar em seu próprio leito e o Estado no seu, sem misturar as sintonias. O entrelaçamento de ambos só produz mal ao Cristianismo, como revela a História. Com isso, a igreja perde um de seus relevantes papéis: a capacidade de ser voz profética pelo comprometimento com alianças espúrias.

7) Contra o pagamento de tributos pelas igrejas, alega-se, ainda, que seria uma espécie de bitributação, visto que os seus membros já pagam impostos sobre os seus proventos. Não seria justo, portanto, as igrejas pagarem "uma segunda vez" sobre as contribuições recebidas. Mas isso não é bitributação, pois na origem não está o mesmo fator gerador. Considero inconsistente o argumento. Assim como contribuímos para a igreja, também contribuímos para outras organizações ou pagamos mensalidades e anuidades para diferentes associações, as quais, também, pagam os seus impostos, na forma da lei. Estaria, nesses casos, igualmente, havendo bitributação? De forma alguma! Pagamos como pessoa física. As entidades pagam como pessoa jurídica.

8) Assim sendo, concluo afirmando que, por simetria aos textos bíblicos já aludidos e aos exemplos já mencionados, as instituições de ofício religioso deveriam ser tributadas, levando-se em conta, por óbvio, todas as nuances que possam tornar a carga tributária justa, como, por exemplo, a isenção sobre recursos próprios que tiverem sido empregados no âmbito social e educacional. Igreja é Igreja. Estado é Estado. Quanto mais estiverem distantes um do outro, cada um cumprindo o seu papel, melhor.


Fonte:http://geremiasdocouto.blogspot.com.br
Autor: Pr.Geremias do Couto

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